sábado, 21 de novembro de 2009

Solenidade de Cristo, Rei do Universo - Ano B - 2009

Evangelho (João 18,33b-37)

— O Senhor esteja convosco!
— Ele está no meio de nós!
— Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, + segundo João.
— Glória a vós, Senhor!

Naquele tempo, 33b Pilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: “Tu és o rei dos judeus?” 34 Jesus respondeu: “Estás dizendo isto por ti mesmo ou outros te disseram isto de mim?” 35 Pilatos falou: “Por acaso sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?” 36 Jesus respondeu: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui”. 37 Pilatos disse a Jesus: “Então tu és rei?” Jesus respondeu: “Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz”.

— Palavra da Salvação.
— Glória a Vós, Senhor!

Caros amigos, estamos iniciando a última semana desse ano litúrgico. É a Solenidade de Cristo, Rei do Universo. A Igreja renova a certeza de que a Jesus foi entregue todo "o poder, glória e realeza" (Cf. Dn 7, 14a). E, embora seu reinado ainda seja desconhecido desse mundo, ele se manifestará plenamente no final dos tempos, quando Ele virá "com as nuvens e todos os olhos o verão" (Cf. Ap 1, 7a).

Diante da pergunta de Pilatos sobre se ele era realmente rei, Jesus responde que seu reino não é deste mundo (cf. Jo 18, 36). E por que? Porque seu reino é pautado na Verdade e aberto a todos os que procuram acolhê-la em sua vida.

Hoje, somos convidados a proclamar o reinado do Senhor. Submeter toda a nossa existência ao seu poder, deixando-nos guiar por seu amor. Concretamente, isso nos levará a realizar um compromisso - um verdadeiro pacto - com a Verdade. Somos impelidos pelo poder de nosso Rei a, em primeiro lugar, banir de nossa vida toda a forma de mentira. E, por fim, sustentados por seu amor, a assumir a vivência da Verdade em todas as suas conseqüências: seja no terrível instante em que defendê-la implicará pender com ela da Cruz, mas também no glorioso momento em que, ressurgiremos com ela para com ela reinar por toda a eternidade! Sim, amém!

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Audiência Geral com o Papa [18.11.2009]

Bento XVI
Audiência Geral - Sala Paulo VI (Vaticano)
Quarta-feira, 11 de novembro de 2009



Queridos irmãos e irmãs!

Na catequese da semana passada, eu apresentei alguns aspectos da teologia medieval. Mas a fé cristã, profundamente enraizada nos homens e mulheres daqueles tempos, não deu origem somente a obras-primas da literatura teológica, do pensamento e da fé. Também inspirou uma das maiores criações artísticas da civilização universal: as catedrais, a verdadeira glória da Idade Média cristã. De fato, por quase três séculos, a partir do início do século XI, se testemunhou na Europa um extraordinário fervor artístico. Um antigo cronista descreve o entusiasmo e o trabalho árduo da época: “Aconteceu que em todo o mundo, especialmente na Itália e na Gália, se começou a reconstruir as igrejas, apesar de que muitas, ainda estando em bom estado, não tivessem necessidade de restauração. Era como uma disputa entre um povo e outro; ninguém acreditava que o mundo, sacudindo os trapos velhos, quisesse se revestir por inteiro do manto branco de novas igrejas. Enfim, quase todas as igrejas catedrais, um grande número de igrejas monásticas, e mesmo algumas capelas do interior foram então restauradas pelos fiéis” (Rodolfo, o glaubro, Historiarum 3,4).

Vários fatores contribuíram para este ressurgimento da arquitetura religiosa. Em primeiro lugar, as condições históricas mais favoráveis, tais como uma maior segurança política, acompanhada de um aumento constante da população e do desenvolvimento progressivo das cidades, do comércio e da riqueza. Além disso, os arquitetos identificaram soluções técnicas mais aprimoradas para aumentar o tamanho dos prédios, garantindo-lhes, ao mesmo tempo, a imponência e a majestade. Mas foi principalmente devido ao ardor e ao zelo espiritual do monaquismo em plena expansão que foram elevados igrejas e mosteiros, onde a liturgia podia ser celebrada com dignidade e solenidade e os fiéis podiam fazer uma pausa para a oração, atraídos pela veneração das relíquias de santos, razão das incessantes peregrinações. Assim nasceram as igrejas e catedrais romanas, caracterizadas pela largueza no comprimento dos corredores, para acomodar os numerosos fiéis; grandes igrejas, com paredes espessas, arcos de pedra e de linhas simples e essenciais. Uma novidade é a introdução das esculturas. Sendo as igrejas romanas, o lugar da oração monástica e do culto dos fiéis, os escultores, ao invés de se preocuparem com a perfeição técnica, se importavam de modo especial com a finalidade educativa de suas obras. Já que deviam inspirar nas almas fortes impressões, sentimentos que capazes de encorajá-las a abandonar o vício, o mal e a praticar a virtude, o bem, o tema recorrente era a representação de Cristo como o juiz universal, cercado pelos personagens do Apocalipse. Normalmente são os portais de igrejas romanas que oferecem esta ilustração para enfatizar que Cristo é a porta que leva ao céu. Os fiéis, cruzando o limiar do edifício sagrado, entram num tempo e num espaço diferentes daqueles da vida cotidiana. Acima da porta da igreja, estão os fiéis em Cristo, soberano, justo e misericordioso, representavam o antegozo da bem-aventurança eterna que os fiéis em Cristo podiam sentir na celebração da liturgia e em atos de piedade realizados no interior do edifício sagrado.

Nos séculos XII e XIII, a começar do norte da França, se difundiu outro tipo de arquitetura na construção de edifícios sagrados, o gótico, com duas novidades em relação ao romano, ou seja, o impulso vertical e o brilho. As catedrais góticas demonstravam uma síntese de fé e arte harmoniosamente expressa por meio da linguagem universal e fascinante da beleza, que ainda hoje impressiona. Graças à introdução dos grandes arcos que repousam sobre fortes pilares, foi possível aumentar significativamente a altura dos edifícios. O impulso em direção ao alto queria convidar à oração e era, ele mesmo, uma oração.

A catedral gótica procurava, dessa forma, traduzir em suas linhas arquitetônicas, o anseio das almas para Deus. Além disso, com as novas soluções técnicas adotadas, as paredes externas podiam ser perfuradas e decoradas com vitrais. Em outras palavras, as janelas se tornavam grandes imagens luminosas, bem próprias para educar o povo na fé. Nelas - cena por cena – eram narradas a vida de um santo, uma parábola ou outras passagens bíblicas. Dos vitrais saíam uma cascata de luz que se derramava sobre os fiéis para lhes contar a história da salvação e para envolvê-los nessa história.

Outro mérito das catedrais góticas é o fato de que da construção e decoração, tão diferente, mas harmoniosa, participou toda a comunidade cristã e civil: humildes e poderosos, analfabetos e doutores, porque nesta casa comum todos eram instruídos na fé. A escultura gótica fez das catedrais uma “Bíblia em pedra”, representada por episódios do Evangelho e ilustrando os conteúdos do ano litúrgico, do Natal à glorificação do Senhor. Naqueles séculos, além disso, se difundia cada vez mais a percepção da humanidade do Senhor e os sofrimentos de sua paixão vinham retratados de forma realista: o Cristo sofredor (Christus patiens) tornou-se uma imagem querida por todos e própria para inspirar compaixão e arrependimento dos pecados.

Os fiéis que lotavam as catedrais góticas também gostavam de encontrar expressões artísticas dos santos, modelos de vida cristã e intercessores junto a Deus. E não faltaram manifestações “seculares” de sua existência; apareciam, aqui e ali, representações vindas dos campos, das ciências e das artes. Tudo era orientado e oferecido a Deus no lugar onde se celebrava a liturgia. Podemos compreender melhor o significado que vinha atribuído a uma catedral gótica, considerando o texto gravado no portão central da Saint-Denis, em Paris: “Peregrino, quem quer louvar a beleza dessa porta, não se deixe deslumbrar por seu ouro, nem por sua magnificência, mas sim por seu duro trabalho. Aqui reluz uma obra famosa, mas queira Deus que esta famosa obra que reluz faça brilhar os espíritos, para que com a verdade que ilumina se encaminhem à verdadeira luz, onde Cristo é a verdadeira porta”.

Queridos irmãos e irmãs, gostaria ainda de destacar dois elementos do estilo romano e gótico, úteis também para nós. O primeiro: as obras-primas da Europa dos séculos passados são incompreensíveis se não se levar em conta a alma religiosa que as inspiraram. Um artista que sempre afirmou o encontro entre a estética e a fé, Marc Chagall, escreveu que “por séculos, os pintores molhavam seus pincéis naquele alfabeto colorido que era a Bíblia.” Quando a fé, especialmente celebrada na liturgia, encontra a arte, se cria uma profunda sintonia, para que ambos possam e queiram falar de Deus, tornando visível o invisível. Gostaria de compartilhar isso no encontro com os artistas em 21 de novembro, repetindo para eles aquela proposta de amizade entre a espiritualidade cristã e a arte, ansiada pelos meus venerados predecessores, especialmente os Servos de Deus Paulo VI e João Paulo II. O segundo elemento: a força do estilo romano e o esplendor das catedrais góticas nos lembram que a via pulchritudinis, o caminho da beleza, é um caminho privilegiado e fascinante para aproximar-nos do mistério de Deus. Que é a beleza, que os escritores, poetas, músicos, artistas contemplaram e traduziram em sua língua, senão o reflexo do esplendor do Verbo eterno feito carne? Agostinho diz: “Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a beleza do ar difuso e suave. Interroga a beleza do céu, interroga a ordem das estrelas, interroga o sol, que ilumina o dia com seu esplendor; interroga a lua, que com o seu brilho, suaviza a escuridão da noite. Consulta os animais que se movem nas águas, que caminham pela terra, que voam pelo ar: almas que se escondem, corpos que se mostram; guias visíveis e invisíveis. Interroga-os! Todos responderão: Olha para nós, somos belos! São conhecidos por causa de sua beleza. Esta beleza mutável, quem a criou, se não a Beleza imutável?” (Sermo CCXLI, 2: PL 38, 1134).

Queridos irmãos e irmãs, o Senhor nos ajude a reencontrar o caminho da beleza como uma das vias, talvez a mais atraente e fascinante, para conseguir encontrar e amar a Deus.

(tradução livre, exclusiva para esse blog)

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Encontro a sós [Ziza Fernandes]

Bem nos teus braços quero estar
Me refazer diante das pedras lançadas
Não quis errar, nem acertar
Eu quis somente te encontrar nas portas que eu bati

A cada dia que eu viver
Eu vou tentar reconhecer a estrada certa
Tua verdade quero amar
Pagar o preço por pensar e ser sincera

Foi devagar que eu te vi
Num vulto meu eu te perdi
Te procurei, me distraí comigo mesma

Já não é mais o meu lugar
Hoje já sei por onde andar
Eu vou buscando devagar teus passos na longa estrada

Mas se eu me achar sem ver a Ti
Não me levará a nada
Se eu me perder sem ser em Ti
Não me valerá de nada


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Aspirei o teu perfume e te desejei



"Tarde te amei, Beleza tão antiga e tão nova,

tarde demais eu te amei...!

Tu estavas dentro de mim e eu te buscava do lado de fora.
Eu, disforme, buscava as belas formas das tuas criaturas.
Estavas comigo, mas eu não estava contigo.

Mantinham-me amarrado, longe de ti, as tuas criaturas
que, se não fossem sustentadas por ti, deixariam de existir.

Tu me chamaste e teu grito rompeu minha surdez.
Brilhaste e resplandeceste diante de mim,
e a tua luz dissipou minha cegueira.

Exalaste a tua fragância, aspirei o teu perfume e te desejei.
Saboreei-te, e agora tenho fome e sede de ti.
Tocaste-me e agora estou ardendo no desejo de tua paz."

(Santo Agostinho)


sábado, 14 de novembro de 2009

33º Domingo do Tempo Comum - Ano B - 2009

Evangelho (Marcos 13,24-32)

— O Senhor esteja convosco!
— Ele está no meio de nós!
— Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, segundo Marcos.
— Glória a vós, Senhor!

Naquele tempo, Jesus disse a seus discípulos: 24“Naqueles dias, depois da grande tribulação, o sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais, 25 as estrelas começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas. 26 Então vereis o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e glória. 27 Ele enviará os anjos aos quatro cantos da terra e reunirá os eleitos de Deus, de uma extremidade à outra da terra. 28 Aprendei, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto. 29 Assim também, quando virdes acontecer essas coisas, ficai sabendo que o Filho do Homem está próximo, às portas. 30 Em verdade vos digo, esta geração não passará até que tudo isto aconteça. 31 O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão. 32 Quanto àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas somente o Pai”.

— Palavra da Salvação.
— Glória a Vós, Senhor!



Estamos chegando ao final de um ano litúrgico, com a Festa de Cristo Rei, a ser celebrada no domingo que vem, ao mesmo tempo em que, nos preparamos para iniciar um novo ano, com a celebração do Tempo do Advento do Senhor. Esse período da vida da Igreja é muito privilegiado para celebrarmos a grande esperança cristã: "Este Jesus que vos foi arrebatado para o céu, voltará do mesmo modo como o vistes partir" (At 1, 11b).

Apesar da linguagem apocalíptica — própria de textos como o que escutamos na Primeira Leitura (cf. Dn 12, 1-3) e no trecho do Evangelho da Santa Missa desse Domingo — tratar esse tão esperado momento como se estivesse muito próximo a se cumprir, ninguém sabe exatamente quando estas coisas se realizarão (cf. Mc 13, 32; At 1, 7). Na verdade, tal linguagem tem a única intenção de nos ensinar como é chamado a viver aquele que aguarda (e anseia!) esse grande Dia.

No Evangelho desse Domingo, o Senhor nos convida a considerarmos a figura transitória desse mundo. De fato, tudo nesse mundo passa...! Ora, se é assim, por que colocarmos nossa esperança em coisas que perecem? Por que fazer consistir o sentido de nossa vida em coisas que hoje valem, mas que amanhã não valem mais? Somos chamados a edificar nossa existência no Senhor, única realidade que permanece para sempre (cf. Mc 13, 31)! Isso não significa dizer um "não" absoluto a tudo o que é desse mundo, mas não lhe dar um valor superior ao que realmente possui...

Com a vinda do Senhor, este mundo se transformará, dando lugar a "novos céus e uma nova terra" (cf. 2 Pd 3,13), onde "toda a lágrima será enxugada de seus olhos" e onde "já não haverá morte, não haverá mais luto, nem clamor, nem sofrimento, pois o mundo antigo desapareceu." (Ap 21, 4).

Diante de uma promessa assim tão feliz, como pode um cristão ter medo esse Dia? Antes, seu coração deve se encher de alegria e esperança e, por meio de atos concretos, seguir clamando: "Assim seja. Vem, Senhor Jesus!" (Ap 22, 20b).

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.

O Sacramento da Confirmação

Por que o Sacramento do Crisma tem que ser ministrado pelo Bispo e não por um padre como os outros sacramentos?
(Graça, São Paulo)

Olá, Graça!
Obrigado por visitar o blog e pela pergunta!

Para responder à sua pergunta, em primeiro lugar, é necessário conhecer qual a natureza do ministério episcopal e de sua missão na Igreja, ou seja, em outras palavras, quem é o bispo e qual a sua função junto ao povo de Deus. Para isso, lhe indico a leitura de um trecho de um importante documento da Igreja:

Constituição Dogmática Lumen Gentium, 20. 24-27


Por aqui, o que podemos dizer em rápidas palavras, é que o Bispo, enquanto sucessor dos apostólos, tem a missão de ensinar, santificar e governar a porção do povo de Deus confiada a seus cuidados. Ora, um sucessor dos apóstolos, em sua missão de santificar, é o primeiro ministro não somente do Sacramento da Confirmação, mas de todos os Sacramentos da Igreja.

Acontece que, com o passar do tempo, já nos primeiríssimos séculos da vida da Igreja, o contínuo aumento do número de fiéis e o rápido crescimento das estruturas eclesiais foram tornando praticamente impossível o exercício do ministério episcopal em primeira pessoa. Daí que também foram sendo delineadas as missões do presbítero (padre) e do diácono como aqueles que colaboram diretamente com a missão do Bispo. Mas, então, por que no caso da administração dos Sacramentos, apenas alguns (Ordem e Confirmação, por exemplo) acabaram ficando reservados exclusivamente ao Bispo? Para responder a essa pergunta, precisamos, além de saber a natureza e missão do ministério episcopal, entender o que cada um desses Sacramentos significa, para então compreendermos a estreita ligação entre o Bispo e a administração dos mesmos.

No caso do Sacramento da Confirmação, ele faz parte dos Sacramentos da Iniciação Cristã (= Batismo, Eucaristia e Confirmação), sem os quais, como o nome sugere, não se pode dizer que o fiel foi devidamente iniciado na fé cristã. A Confirmação aprofunda e consolida a graça batismal e "tem como efeito unir aqueles que o receberam, mais intimamente à Igreja, às suas origens apostólicas e à sua missão de dar testemunho de Cristo" (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1313).


Ora, se o Sacramento da Confirmação "tem como efeito unir aquele que o recebe mais intimamente à Igreja", é o Bispo - que fazendo as vezes de Cristo, Pastor da Igreja, e desempenhando suas funções - a pessoa mais indicada para presidir tal Sacramento.

Além disso, se o mesmo Sacramento "tem como efeito unir aquele que o recebe (...) às origens apostólicas (da Igreja)", é o Bispo - como legítimo sucessor dos Apóstolos - a pessoa que evidencia a apostolicidade da Igreja no momento da celebração.

Por fim, se o Sacramento da Confirmação "tem como efeito unir aquele que o recebe (...) à missão (da Igreja) de dar o testemunho de Cristo", é o Bispo - enquanto pastor daquela Igreja local, em união com toda Igreja universal - aquele que, por excelência, envia, em nome de Cristo, o fiel confirmado em missão "até os confins da terra" (Cf. At 1,8).

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.

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Conforto...

Ontem, antes de dormir, abri as Escrituras. Deparei-me com palavras de uma doçura tão grande que não poderia deixar de partilhá-las com você. Não sei onde está nesse exato momento, muito menos o que tem enfrentado em sua vida, mas sei que Deus quer visitá-lo por meio de sua Palavra, da mesma forma como me visitou ontem. Foi, aliás, essa convicção que me trouxe aqui tão cedo para lhe desejar um bom dia...

Deus te abençoe!

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.



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Livro da Sabedoria

18,14 Quando um tranqüilo silêncio envolvia todas as coisas e a noite chegava ao meio de seu curso, 15 a tua palavra onipotente, vinda do alto do céu, do seu trono real, precipitou-se, como guerreiro impiedoso, no meio de uma terra condenada ao extermínio; como espada afiada, levava teu decreto irrevogável; 16 defendendo-se, encheu tudo de morte e, mesmo estando sobre a terra, ela atingia o céu.

19,6 Então, a criação inteira, obediente às tuas ordens, foi de novo remodelada em cada espécie de seres, para que teus filhos fossem preservados de todo perigo.

7 Apareceu a nuvem para dar sombra ao acampamento, e a terra enxuta surgiu onde antes era água: o mar Vermelho tornou-se caminho desimpedido, e as ondas violentas se transformaram em campo verdejante, 8 por onde passaram, como um só povo, os que eram protegidos por tua mão, contemplando coisas assombrosas. 9 Como cavalos soltos na pastagem e como cordeiros, correndo aos saltos, glorificaram-te a ti, Senhor, seu libertador.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Posso comungar duas vezes num mesmo dia?

Se vou duas vezes à Missa ao domingo, é certo comungar as duas vezes?
(Graça, São Paulo)

Olá, Graça!
Obrigado pela visita ao blog e pela pergunta!

Antes de responder a sua pergunta, é bom salientar que não há necessidade de participarmos de mais de uma Missa por dia, já que numa única celebração recebemos de Deus tudo quanto necessitamos para nossa salvação. Contudo, por alguma circunstância especial, havendo a necessidade de participar de uma segunda Celebração Eucarística ao longo do mesmo dia, a Igreja permite que se receba novamente a santíssima Eucaristia, conforme se lê no cânone que transcrevo abaixo:

"Quem tiver recebido a santíssima Eucaristia pode voltar a recebê-la no mesmo dia, mas somente dentro da celebração eucarística em que participe..." (Código de Direito Canônico, cânone 917)

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.


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quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Não pecar contra a castidade. Que é isso?

Padre, gostaria de uma explicação maior do 6º mandamento: Não pecar contra a castidade.
(Roberto, 14 anos, São Paulo)

Olá, Roberto!
Obrigado pela visita ao blog e pela pergunta!

Para tentar compreender melhor o 6º mandamento, a primeira pergunta que podemos nos fazer é sobre o que significa a palavra "castidade", já que atualmente, quando ela não é absolutamente esquecida, tem seu significado totalmente desfigurado.

O Catecismo da Igreja Católica define castidade como sendo "a correta integração da sexualidade na pessoa" (CaIC 2337); isso em outras palavras, significa a vivência da sexualidade de maneira verdadeiramente humana.

Mas o que é a sexualidade? A pergunta é simples, mas a resposta é bem complexa. Em todo o caso, a Igreja nos ensina que a sexualidade "diz respeito particularmente à afetividade, à capacidade de amar e de procriar e, de uma maneira geral, à aptidão a criar vínculos de comunhão com os outros (CaIC 2332).

Assim, podemos dizer que uma simples amizade para ser casta, precisa ser um espaço onde os amigos cresçam na comunhão uns com os outros, sem, por exemplo, instrumentalizar ninguém em prol de interesses pessoais. Isso vale, de maneira especial, para o relacionamento amoroso entre homem e mulher: para ser uma relação casta, precisa promover uma verdadeira comunhão, a partir da qual ambos realizem de maneira digna a própria capacidade de amar.


Para crescermos na vivência da castidade, precisamos, em primeiro lugar, procurar viver, pessoalmente, o amor de maneira íntegra, evitando toda espécie de comportamento duplo. Além disso, como a vida casta nos orienta à comunhão, aprendemos com ela a nos doar por inteiro, tornando-se para os outros, testemunhas do amor e da ternura de Deus que se doou inteiramente a nós.

Por fim, toda situação ou comportamento que ofende o amor verdadeiramente humano, ou seja, aquele que se espelha no amor de Deus, fere e ofende a castidade. Obedecer ao sexto mandamento, implica, de um modo geral, rejeitar toda a forma de banalização do amor.

A partir desses mínimos conceitos, podemos começar a analisar casos concretos, dos quais podem (e devem!) surgir muitas perguntas do tipo "viver desse jeito, corresponde à uma vida casta?" Perguntar-se sobre isso é atitude fundamental para quem deseja responder com fidelidade ao 6º mandamento. Bem, meu caro Roberto, mas para analisar situações concretas, vou aguardar suas outras perguntas, está bem?

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.

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quarta-feira, 11 de novembro de 2009

A abadia de Cluny [França]

Caro amigo,

Na postagem anterior, pudemos ver que o Papa Bento XVI dedicou sua catequese de hoje à então chamada "Reforma de Cluny", cuja história ele mesmo forneceu elementos suficientes para uma boa compreensão da extensão e alcance de tão importante movimento.

Como havia dito na pequena introdução ao discurso do Papa, tive a graça de visitar o lugar onde se encontram os escombros dessa antiga abadia (Borgonha, ao centro-nordeste da França), em abril desse ano. Estávamos realizando uma peregrinação aos lugares de São Francisco de Sales, quando então "desviamos" a rota para conhecer um dos mais importantes centros religiosos e culturais da Idade Média.

Para além do que você já pode ler na postagem anterior, vale dizer ainda que o imenso complexo da abadia foi destruído quase que totalmente por ocasião da Revolução Francesa. Mas o que resta hoje do complexo oferece condições ao visitante para se ter idéia do que a abadia representou durante o grande período em que existiu. Abaixo, algumas fotos, como prometido.

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.


Maquete da Abadia de Cluny, no momento mais alto de sua expansão: acima, o complexo visto de frente; abaixo, uma visão lateral que possibilita também vê-lo aos fundos.




A foto acima e as duas abaixo mostram o pouco que sobrou da Abadia de Cluny.


Audiência Geral com o Papa [11.11.2009]

Caro amigo,

Nessa manhã, em audiência geral aos peregrinos no Vaticano, o Papa Bento XVI continuou sua série de catequeses. Hoje, ele falou de um importante movimento da Idade Média que, para além do que representou à vida da Igreja, contribuiu em muito à formação da identidade do continente europeu. Tive a graça de, no início desse ano, visitar o lugar onde tudo o que o Papa relatou, teve seu início (prometo dedicar a próxima postagem para algumas fotos que tirei do local quando por lá estive!).

As palavras do Papa são, a meu ver, um grande e profundo convite à reflexão, diante de forças que, recentemente, estão se levantando pela Europa e, creio, ainda demonstrarão seu poder de influência no Brasil, onde aliás, já estão presentes...

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.


Bento XVI
Audiência Geral - Praça de São Pedro
Quarta-feira, 11 de novembro de 2009


Caros irmãos e irmãs,

Nessa manhã, gostaria de vos falar de um movimento monástico que teve grande importância ao longo de toda a Idade Média, do qual eu já fiz algumas referências nas catequeses anteriores. Se trata da Ordem de Cluny, que, nos inícios do século XII, num momento de sua máxima expansão, contava com quase 1.200 mosteiros: um número realmente impressionante! Na cidade de Cluny, há exatos 1.100 anos atrás, no ano de 910, foi fundado um mosteiro confiado aos cuidados do abade Bernão, logo depois da doação de Guilherme, conhecido como "O Piedoso", duque de Aquitânia. Naquele período, o monaquismo ocidental, nascido há alguns séculos atrás com São Bento, estava muito abalado por diversas causas: condições políticas e sociais instáveis devido às contínuas invasões e devastações dos povos que não pertenciam ao mundo europeu, a pobreza cada vez maior e, sobretudo, a dependência das abadias aos senhores feudais que controlavam tudo aquilo que pertencia aos territórios sob seu controle. Em tal contexto, Cluny representou a alma de uma profunda renovação da vida monástica para reconduzi-la aos seus inícios.

Em Cluny, a observância da Regra de São Bento foi restaurada com a introdução de algumas adaptações já existentes em outros reformadores. De uma maneira especial, se queria garantir o papel central que a Liturgia deve ocupar na vida cristã. Os monges cluniacenses se dedicavam com amor e grande dedicação à celebração da Liturgia das Horas, ao canto dos Salmos, às procissões da devoção popular e àquelas solenes, mas, sobretudo, à celebração da Santa Missa. Promoveram a música sacra; quiseram que a arquitetura e a arte contribuíssem para a beleza e para a solenidade dos ritos; enriqueceram o calendário litúrgico de celebrações especiais como, por exemplo, no início de dezembro, a Comemoração dos fiéis defuntos, que também nós celebramos há alguns dias atrás; incrementaram o culto à Virgem Maria. Tanta importância dedicada à liturgia se deve ao fato de que os monges de Cluny acreditavam que ela era uma participação à liturgia do céu. Sentiam-se responsáveis por interceder junto ao altar de Deus pelos vivos e pelos mortos, já que um grande número de fiéis lhes pediam com insistência de serem recordados em suas orações. Justamente para isso é que Guilhermo, o Piedoso, havia desejado o surgimento de uma abadia em Cluny. No antigo documento da fundação do mosteiro, se lê: “Declaro que, com esta doação, seja construído um mosteiro em honra aos santos apóstolos Pedro e Paulo e que lá se reúnam monges que vivam segundo a Regra de São Bento (...), que se fomente um venerável refúgio de oração e se procure com toda força e íntimo ardor a vida celeste, e constantemente sejam elevadas ao Senhor orações, invocações e súplicas". Para conservar e alimentar esse clima de oração, a regra cluniacense valorizou a importância do silêncio, disciplina a qual os monges se submetiam com prazer, certos de que a pureza da virtude que desejavam conquistar, lhes exigia um íntimo e constante recolhimento. Não nos surpreende que bem cedo uma fama de santidade tomou conta do mosteiro de Cluny e que muitas outras comunidades monásticas quiseram imitar seus hábitos. Muitos príncipes e Papas pediram aos abades de Cluny que difundissem suas reformas, à medida em que se formava uma grande rede de mosteiros ligados àquela abadia, seja por meio de vínculos jurídicos propriamente ditos, seja por meio de uma ligação de natureza carismática. Se formava assim uma Europa do espírito nas várias regiões da França, Itália, Espanha, Alemanha e Hungria.

O sucesso de Cluny foi assegurado, antes de tudo, pela elevada espiritualidade que se cultivava ali, mas também por outras condições que lhe favoreciam o crescimento. Diverso de tudo que havia acontecido até então, o mosteiro de Cluny e suas comunidades foram reconhecidos independentes da jurisdição dos Bispos locais e subordinados diretamente à autoridade do Romano Pontífice. Isso implicava uma ligação especial com a sede de Pedro e, graças justamente à proteção e ao encorajamento dos Pontífices, os ideais de pureza e fidelidade, perseguidos pela reforma cluniacense, puderam se difundir rapidamente. Além disso, os abades eram eleitos sem nenhuma interferência da parte das autoridades civis, diferentemente do que acontecia em outros lugares. Pessoas realmente dignas se sucederam na condução de Cluny e na de suas comunidades monásticas: o abade Odão de Cluny, de quem falei em uma catequese há dois meses atrás, e outras grandes personalidades, como Emardo, Maiolo, Odilão e sobretudo Hugo, o Grande, os quais prestaram seu serviço por longo período, assegurando estabilidade à reforma iniciada e à sua difusão. Além de Odão, são venerados como santos Maiolo, Odilão e Hugo.

A reforma cluniacense produziu efeitos positivos não somente na purificação e no reflorescer da vida monástica, mas também na vida de toda a Igreja universal. De fato, o desejo de uma perfeição evangélica representou um estímulo no combate a dois graves males que atingiam a Igreja daquele período: a simonia, isto é, a aquisição de cargos pastorais por dinheiro e a imoralidade do clero secular. Os abades de Cluny, com sua autoridade espiritual, os monges cluniacenses que se tornaram Bispos, alguns deles até mesmo Papas, foram protagonistas dessa imponente ação de renovação espiritual. E os frutos não faltaram: o celibato sacerdotal voltou a ser valorizado e vivido e, na ascensão aos ofícios eclesiásticos, foram introduzidos procedimentos mais transparentes.

Significativos também foram os benefícios oferecidos à sociedade pelos mosteiros inspirados na reforma cluniacense. Numa época em que somente as instituições eclesiásticas cuidavam dos indigentes, a caridade foi praticada com empenho. Em todas as casas, a hospedaria acolhia os viajantes e peregrinos mais necessitados, os padres e religiosos em viagem e, sobretudo, os pobres que vinham pedir comida e abrigo por algum tempo. Importantes também foram outras duas instituições, típicas da civilização medieval, promovidas por Cluny: as assim chamadas “tempos de Deus” e a “paz de Deus”. Numa época fortemente marcada pela violência e pelo espírito de vingança, com os "tempos de Deus" eram assegurados longos períodos de paz, em ocasião de determinadas festas religiosas ou de alguns dias da semana. Com a "paz de Deus" se pedia, sob pena de uma censura canônica, respeito às pessoas desamparadas e aos lugares sagrados.

Na consciência dos povos da Europa se incrementava, assim, aquele processo de longa gestação, que portaria ao reconhecimento, sempre mais claro, de dois elementos fundamentais para a construção da sociedade, isto é, o valor da pessoa humana e o bem primário da paz. Além disso, como acontecia com outras fundações monásticas, os mosteiros cluniacenses dispunham de amplas propriedades que, cultivadas, contribuíram para o desenvolvimento da economia. Ao lado do trabalho manual, não faltaram também algumas atividades tipicamente culturais do monaquismo medieval como as escolas para as crianças, o desenvolvimento das bibliotecas, os lugares destinados à transcrição de livros.

Desse modo, há mil anos atrás, quando era em pleno desenvolvimento o processo de formação da identidade européia, a experiência cluniacense, presente em vastas regiões do continente, ofereceu sua importante e preciosa contribuição. Chamou à atenção o primado dos bens do espírito; manteve viva a tensão em direção às coisas de Deus; inspirou e favoreceu iniciativas e instituições para a promoção de valores humanos; educou para um espírito de paz. Caros irmãos e irmãs, oremos para que todos aqueles que tem um autêntico humanismo no coração e trabalham pelo futuro da Europa, saibam redescobrir, valorizar e defender o rico patrimônio cultural e religioso destes séculos.

(tradução livre, exclusiva para esse blog)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Audiência Geral com o Papa [04.11.2009]

Caros amigos,

Nessa manhã, em audiência geral aos peregrinos no Vaticano, o Papa Bento XVI continuou sua série de catequeses. Hoje, dando prosseguimento à história do desenvolvimento da teologia, o Papa tratou de uma disputa ocorrida no século XII. Embora longo, tenho certeza de que, o texto tem muito a ensinar para a Igreja dos dias de hoje. Abaixo, segue o discurso do Papa, na íntegra.

Com afeto salesiano,
Pe. Mauricio Miranda.


Bento XVI
Audiência Geral - Praça de São Pedro
Quarta-feira, 04 de novembro de 2009


Queridos irmãos e irmãs,

Na última catequese, apresentei as características principais da teologia monástica e da teologia escolástica do século XII, que poderemos de certo modo chamar "teologia do coração" e "teologia da razão". Entre os representantes de uma e de outra corrente teologia se desenvolveu um debate amplo e, muitas vezes, inflamado, simbolicamente representado pela controvérsia entre São Bernardo de Claraval e Abelardo.

Para compreender o confronto entre esses dois grandes mestres, é necessário recordar que a teologia é a procura de uma compreensão racional, na medida do possível, dos mistérios da Revelação cristã acolhidos pela fé - fides quaerens intellectum - a busca da inteligibilidade da fé, para usar uma expressão tradicional, concisa e precisa. Ora, enquanto São Bernardo, típico representante da teologia monástica, coloca o acento na primeira parte da definição, isto é, na fé, Abelardo, que é um escolástico, insiste sobre a segunda parte, ou seja, o intellectus, a compreensão por meio da razão. Para Bernardo, a fé em si mesma é dotada de uma certeza interior fundada no testemunho das Escrituras e nos ensinamentos dos Padres da Igreja. A fé é também reforçada pelo testemunho dos santos e pela inspiração do Espírito Santo na alma de cada um dos fiéis. Em caso de dúvidas e ambiguidades, ela é protegida e iluminada pelo exercício do Magistério da Igreja. Assim, Bernardo encontra dificuldades em concordar com Abelardo e, mais ainda, com todos os que submetiam a verdade da fé ao exame crítico da razão; um exame que comportava, na opinião dele, um grave perigo, o intelectualismo, a relativização da verdade, o questionamento das verdades da fé. Nesse modo de agir, Bernardo via uma audácia que beirava a crueldade, fruto do orgulho da inteligência humana, que pensa poder "capturar" o mistério de Deus. Em sua carta, entristecido, escreve assim: "A mente humana toma conta de tudo, não deixando mais nada à fé. Enfrenta aquilo que está acima de si mesma, examina aquilo que lhe é superior, invade o mundo de Deus, altera os mistérios da fé, em vez de iluminá-los; aquilo que é fechado e obscuro, não o abre, mas o esvazia, e o que não é viável por si mesmo, o desconsidera e se recusa a crer nele"

Para Bernardo, a teologia tem um único objetivo: promover a experiência íntima e viva de Deus. A teologia é, portanto, um auxílio para amar sempre mais e melhor o Senhor... Nesse caminho, existem diversos graus que Bernardo descreve com detalhes até o ponto mais alto, quando a alma do fiel se inebria nos vértices do amor. A alma humana pode alcançar ainda na terra aquela união mística com o Verbo Divino, união que Bernardo descreve como as "núpcias espirituais". O Verbo Divino a visita, elimina suas últimas resistências, a ilumina, a inflama e a transforma. Em tal união mística, a alma goza de uma grande serenidade e doçura, e canta a seu esposo um hino de alegria. Como eu recordei na catequese dedicada à vida de São Bernardo (21.10.2009), a teologia para ele só pode se alimentar da oração contemplativa, em outras palavras da união afetiva do coração e da mente com Deus.

Abelardo, que é precisamente aquele que introduziu o termo "teologia" no sentido que nós o entendemos hoje, se põe em uma perspectiva diversa. Nascido na Bretanha, na França, este famoso professor do século XII, era dotado de uma inteligência vivíssima e a sua vocação era o estudo. Ele primeiro se ocupou com a filosofia e depois aplicou os resultados obtidos com essa disciplina à teologia, da qual foi mestre na cidade mais culta daquela época, Paris, e depois nos mosteiros onde morou. Ele foi um orador brilhante: suas palestras foram seguidas por uma multidão de alunos. De espírito religioso, mas com uma personalidade inquieta, a sua vida foi cheia de supresas: contestou seus professores, teve um filho com uma mulher culta e inteligente, Eloísa. Muitas vezes se meteu em polêmica com seus colegas teólogos, sofreu também condenações eclesiásticas, mas morreu em plena comunhão com a Igreja, a cuja autoridade ele se submeteu com espírito de fé. São Bernardo mesmo contribuiu para algumas condenações de algumas doutrinas de Abelardo no sínodo provincial de Sens, no ano de 1140, e também pediu a intervenção do papa Inocêncio II. O abade de Claraval contestava, como já dissemos, o método demais intelectualista de Abelardo que, ao seu parecer, reduzia a fé a uma mera opinião a respeito da verdade revelada. Os temores de Bernardo não eram infundados e eram condivididos por outros pensadores daquele tempo. Na verdade, o uso excessivo da filosofia enfraqueceu a doutrina trinitária de Abelardo e, dessa forma, a sua idéia de Deus. No campo moral, seus ensinamentos eram cheios de ambiguidade: ele insistiu em considerar a intenção do indivíduo como a única fonte para descrever a bondade ou a maldade dos atos morais, desconsiderando o significado objetivo e o valor moral das ações: um subjetivismo perigoso. Este é, como sabemos, um tema de grande atualidade para a nossa época, em que a cultura é muitas vezes marcada por uma tendência crescente do relativismo ético: somente o eu decide aquilo que é bom para si. Não podemos nos esquecer, porém, os grandes méritos de Abelardo que, tinha muitos discípulos e contribuiu de modo muito significativo para o desenvolvimento da teologia escolástica, destinada a expressar-se de modo mais maduro e seguro no século seguinte. Também não devemos subestimar algumas de suas idéias como, por exemplo, quando ele diz que tradições religiosas não-cristãs, estão preparadas para acolher a Cristo, o Verbo Divino.

O que podemos aprender nós, hoje, do confronto, de tons frequentemente fortes, entre Bernardo e Abelardo e, em geral, entre a teologia monástica e aquela escolástica? Primeiro de tudo, creio que nos mostra a utilidade e a necessidade de uma saudável discussão teológica na Igreja, especialmente quando os assuntos discutidos não foram definidos pelo Magistério que, por sua vez, continua sendo uma referência incontornável. São Bernardo, mas também Abelardo, sempre reconheceram sem exitação a autoridade. Além disso, as condenações que Abelardo sofreu nos recorda que deve haver um equilíbrio entre o que chamamos de princípios arquitetônicos dados a nós pela Revelação e que conservam, portanto, sempre uma prioritária importância, e aquelas interpretações sugeridas pela filosofia, ou seja, pela razão, e que têm um papel importante, mas instrumental. Quando este equilíbrio entre a arquitetura e os instrumentos de interpretação é esquecido, a reflexão teológica corre o risco de ser afetada por erros e é, então, que do Magistério se espera aquele necessário serviço à verdade que lhe caracteriza. Além disso, é bom salientar que dentre os motivos que levaram Bernardo a "tomar partido" contra Abelardo e solicitar a intervenção do Magistério, estava aquele de salvar os fiéis simples e humildes, que devem ser defendidos quando correm o risco de serem confundidos ou desviados por opiniões muito pessoais e por argumentos teológicos duvidosos, que podem comprometer a sua fé.

Gostaria de recordar, enfim, que o confronto teológico entre Bernardo e Abelardo terminou com uma plena reconciliação entre os dois, por meio da mediação de um de seus amigos, o abade de Cluny, Pedro, o venerável, de quem falei em uma das catequeses anteriores (14.10.2009). Abelardo mostrou humildade em reconhecer seus erros e Bernardo usou de grande bondade. Prevaleceu em ambos o que deve realmente estar no centro, quando nasce uma controvérsia teológica: salvar a fé da Igreja e fazer triunfar a verdade na caridade. Que esta seja, ainda hoje, a virtude com a qual se discute na Igreja, tendo sempre como meta a busca da verdade.


(tradução livre, exclusiva para esse blog)

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Sexo antes do casamento

O que a Igreja fala sobre sexo antes do casamento e por que é contra a pílula? A vida de hoje não é muito difícil para se ter muitos filhos?
(Adriana, 22, São Paulo)

Olá, Adriana!
Obrigado pela visita ao blog e pela pergunta!

Bem, na verdade, são três as perguntas que você me fez. Tentarei, de maneira suscinta, comentá-las na mesma postagem, ainda que mereçam, pela importância que possuem, um espaço bem maior... Começaremos tratando-as na ordem inversa em que foram feitas, ou seja, da terceira à primeira.

A primeira coisa que devemos considerar com atenção é que o fato dos tempos de hoje não serem nada fáceis, não nos permite lançar mão de qualquer método para impedir a geração da vida. Em princípio, a Igreja não se opõe ao controle da natalidade, desde que os métodos utilizados para tanto não firam o curso natural da vida.

Por esse motivo, a Igreja desautoriza a utilização da então conhecida "pílula" como medida contraceptiva. De um modo geral, tais composições químicas não respeitam a natureza e a finalidade do ato matrimonial, além de se revelarem, em sua grade maioria - como é o caso da conhecida "pílula do dia seguinte" -, como procedimentos abortivos.



Por fim, o ato conjugal possui dois grandes significados: ao mesmo tempo em que une de modo íntimo e profundo os esposos, os tornam aptos para a geração de novas vidas. É nesse contexto que se compreende a relação sexual como coroação de um longo processo que encontra no matrimônio sua plena realização. Por isso, fora da vida matrimonial, a relação sexual esvazia-se de seu sentido pleno e se afasta da sua mais alta finalidade. Creio que as palavras de João Paulo II expressam bem o pensamento da Igreja a respeito do assunto:

"A sexualidade, mediante a qual o homem e a mulher se doam um ao outro com os atos próprios e exclusivos dos esposos, não é em absoluto algo puramente biológico, mas diz respeito ao núcleo íntimo da pessoa humana como tal. Ela só se realiza de maneira verdadeiramente humana se for parte integral do amor com o qual homem e mulher se empenham totalmente um para com o outro até a morte." (Exort. Apostólica Familiaris Consortio, 11)

É claro que, com essas poucas palavras, não estamos colocando um ponto final a tão complexo tema. São apenas sinalizações que o pouco espaço de que dispomos nos permite realizar. Continuamos abertos às novas e possíveis perguntas que procurem aprofundar o assunto.

Com afeto salesiano,
P. Mauricio Miranda.

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