sexta-feira, 6 de junho de 2008

Deus de toda a misericórdia - Conclusão 2


Conforme prometido, concluímos essa série de postagens sobre a Misericórdia. Com essa "segunda" conclusão, foram ao todo, nove textos dedicados ao tema. Mesmo tendo ainda muito o que falar sobre o assunto, creio ter dito o mínimo suficiente para que tivéssemos alguns poucos elementos para refletir e orar. Hoje, por fim, analisaremos a segunda parte de toda a parábola do Pai Misericordioso, ou seja, os versículos 25 a 32 que, agora, exponho abaixo:

25 O Filho mais velho estava nos campos. Quando, ao voltar, se aproximou da casa, ouviu músicas e danças. 26 Chamando um dos servos, perguntou-lhe o que era aquilo. 27 Este lhe disse: 'É teu irmão que chegou e teu pai matou o bezerro gordo por tê-lo visto voltar bem de saúde'. 28 Então ele se encheu de cólera e não quis entrar. O pai saiu para pedir-lhe que entrasse; 29 mas ele disse ao seu pai: 'já faz tantos anos que eu te sirvo sem ter jamais desobedecido às tuas ordens; e, a mim, nunca deste um cabrito sequer para festejar com meus amigos. 30 Mas quando chegou esse teu filho que devorou teus bens com prostitutas, mataste o bezerro gordo para ele!' 31 Então o pai lhe disse: 'Meu filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. 32 Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão tinha morrido e está vivo; estava perdido e foi reencontrado'.

A cena, em si, nos parece clara: o irmão mais velho volta do trabalho no campo e, ao saber que o pai fazia festa ao irmão que havia retornado, se enche de cólera. Devo confessar uma coisa a vocês: sempre que leio esse trecho do evangelho, fico um pouco triste comigo mesmo porque minha primeira reação é a de dar plena razão ao irmão mais velho. É isso mesmo... A princípio, ela sempre me pareceu justa. Mas toda vez que leio, sempre acabo pedindo que Deus modifique meu coração que ainda não aprendeu o que realmente significa misericórdia...

A observação feita pelo irmão mais velho tem, a princípio, certa coerência. Ele, de fato, sempre trabalhou para seu pai e nunca havia recebido uma festa como aquela que agora via ser realizada para seu irmão que tinha - digamos a verdade - abandonado a casa e a família. Porém, a resposta que o pai lhe dá, nos ajuda a abrir também os nossos olhos... Vamos analisá-la melhor?

"Meu filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu, mas..."

Nessa resposta, em primeiro lugar o pai o reconhece como filho! E isso é muito importante! Reconhece também que ele sempre esteve ao seu lado e, exatamente por isso, declara que tudo o que é seu é dele também. Em nenhum momento, portanto, desmerece o próprio filho e a herança que, por direito, é dele. Em outras palavras, o pai proclama a justiça contida nos atos do próprio filho. Porém, assinala ao filho que lhe faltava o principal: a misericórdia! Era isso que tornava o coração daquele pai diferente do coração de todos!

É muito importante compreender as palavras de Jesus no contexto em que elas foram pronunciadas para que entendamos o sentido de toda a parábola. Recordem-se que Ele procurava responder à murmuração que partia dos fariseus, expressa em Lc 15, 2: "este homem dá boa acolhida aos pecadores e come com eles!" É por causa desse comentário que as três parábolas são incluídas ao longo desse capítulo do evangelho de Lucas. E o que de tão grave assim existe nesse tipo de comentário? Minimamente, podemos falar de intolerância e profunda crueldade...

Para entender melhor, precisamos nos perguntar sobre quem eram os fariseus. Fariseu (em hebraico, פרושים) era o nome dado a um grupo de judeus muito observantes da Torá, surgido no século II a.C. Com a destruição de Jerusalém (aproximadamente, 70 d.C.) e com a perda do poder por parte dos saduceus - de quem eram principais opositores - passaram a exercer grande influência no judaísmo de então. Tudo indica que fossem extremamente legalistas. A figura do irmão mais velho nessa parábola, tem por intenção, retratá-los. Notem que, na fala desse personagem, existe a seguinte expressão: "já faz tanto tempo que eu te sirvo sem ter jamais desobedecido às tuas ordens" (Lc 15, 29). Essa afirmação revela a confiança que os fariseus tinham de serem salvos pela estrita obediência à Lei. E, acreditem, isso não é um mal em si... Porém, a fala que condena o personagem e, que portanto, denuncia o público para o qual essa parábola se destinava, é essa: "mas quando chegou este teu filho..." Observem que com a expressão "este teu filho", o irmão mais velho se recusa a reconhecê-lo como irmão pelo simples fato de não ter sido fiel até o fim, como ele. Pois bem... Era exatamente assim que os fariseus agiam: não reconheciam os pecadores como filhos de Deus e, portanto, irmãos, simplesmente pelo fato de não conseguirem ser fiéis como eles imaginavam ser.

Meus amigos, precisamos admitir que em nossas comunidades e grupos, hoje em dia, costumamos agir muitas vezes assim... Quantas vezes nos julgamos melhores e mais dignos de reconhecimento que as outras pessoas! Por detrás de ações dessa natureza existem - verdade seja dita - intolerância e a mais cruel falta de misericórdia...

Com isso, Jesus não está dizendo que não vale a pena ser fiel até o fim. Pelo contrário, a fidelidade é tudo o que temos de buscar até o último minuto de nossa vida! Mas de nada adianta vivê-la se não formos movidos por amor... E por que? Porque Deus é amor e "amor com amor se paga". Uma fidelidade cega não leva a lugar nenhum...

Na verdade, meus amigos, se não há amor, não se pode falar de verdadeira fidelidade. Uma pessoa pode guardar todos os mandamentos e preceitos da Escritura, mas pode fazer por medo de Deus, por conveniência, por necessidade de ser reconhecida pelos outros, enfim, por tantos motivos internos. Essa atitude, no entanto, só será fidelidade quando for, em si, uma resposta de amor ao amor que de Deus recebemos!

É... Não sei como se sente o seu coração. O meu se sente pequenino... Sinto que preciso aprender, a cada dia, a amar de verdade. Ainda não sei o que é isso... Sinto que preciso ser fiel por amor e, com misericórdia, ajudar os meus irmãos a o serem também! É essa graça que tenho pedido a Deus.

Por falar nisso, sabem que quanto mais crescemos no amor, mais vamos aprendendo o que significa, de verdade, a palavra pecado? É, é isso mesmo! E aí está uma outra palavra, assim como misericórdia, tão distorcida ou, até mesmo, esquecida em nossos dias.

Acho que vale a pena dedicar algumas postagens a ela também (hehe). Querem me acompanhar mais um pouco? Se toparem o desafio, a partir de manhã tentaremos entender, com novos olhos, o que é o pecado e o que ele tem a ver com tudo o que descobrimos até agora. Humildemente, tenho a certeza de que o Deus de toda a misericórdia continuará "navegando" conosco por essa simples página da web...

Com afeto salesiano
P. Mauricio Miranda.

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