quarta-feira, 4 de junho de 2008

Deus de toda a misericórdia - Parte 7


Começo essa postagem pedindo desculpas por não ter atualizado o blog no dia de ontem. Não consegui sair do meio dos livros em preparação para os exames desse semestre. Mas hoje, retomo o caminho simples que temos feito em direção ao Deus de toda a misericórdia.

Dedicaremos dois dias para fixarmos nossa atenção na, talvez, mais bela das parábolas de Jesus. Antes de entrar no blog, li com atenção versículo por versículo dela. Confesso que me senti muito pequeno e incapaz de transmitir a riqueza de seu conteúdo. No entanto, sei que Deus possui seus próprios caminhos; tudo o que procuro fazer aqui é dar um primeiro passo, a Graça fará todo o percurso. Esse meio tecnológico da internet me dá a esperança de que, em algum lugar do mundo, alguém que entenda o português estará fazendo a experiência da misericórdia de Deus por meio dessas poucas palavras.

Aliás, recentemente, conversava com uma amiga minha que me contava um história verídica que muito me impressionou. Ela tem uma amiga brasileira que mora nos Estados Unidos e é casada com um soldado norte-americano que participou de uma dessas atividades de guerra no Oriente Médio. Um dia, essa sua amiga, se dirigindo ao banheiro para tomar um banho, deixou aberta uma página da internet com vários vídeos de músicas católicas brasileiras. Quando voltou ao quarto, encontrou seu esposo em frente ao computador, chorando. Ao lhe questionar sobre o que havia acontecido, ele lhe perguntou que coisa cantava aquela pessoa naquele vídeo em português, pois mesmo sem compreender nenhuma palavra, aquela canção o havia feito sentir uma sensação de conforto tão grande que não resistiu e chorou. Pois bem, a música era uma invocação ao Espírito Santo. Bem, não é preciso comentar nada. Deus realmente tem seus próprios caminhos...

A Parábola do Filho Reencontrado

O texto de que trata Lc 15, 11-32 é mais conhecido como a parábola do filho pródigo. Aqui no blog, nós o chamamos de a parábola do filho reencontrado, pois é esse o termo que temos usado para nossas reflexões (ovelha reencontrada e moedas reencontradas...). De fato, entre pródigo e reencontrado há uma diferença: o segundo possui um significado mais otimista, procurando valorizar o fato de que, nós, filhos de Deus, fomos reencontrados por Ele! Porém, creio que o nome mais fiel à mensagem central dessa parábola seja o de a "Parábola do Pai Misericordioso". De fato, o centro de toda a parábola não é o que faz o filho, e sim, como reage o pai ao longo de toda a história.

Para melhor compreender esse texto, vamos nos ater, hoje, somente a uma primeira parte dele. Abaixo, eu o reescrevo para que você o tenha bem presente na memória e no coração:

11 Ele disse ainda: Um homem tinha dois filhos. 12 O mais jovem disse ao seu pai: 'Pai, dá-me a parte de bens que me cabe'. E o pai fez para eles a partilha dos seus bens. 13 Poucos dias depois, o filho mais jovem, tendo juntado o dinheiro, partiu para uma região longínqua e aí gastou todos os seus pertences numa vida desregrada. 14 E quando acabou de gastar tudo, uma grande fome sobreveio naquela região e ele começou a passar necessidade. 15 Foi pôr-se a serviço de um dos cidadãos desse país que o enviou para os seus campos para cuidar de porcos. 16 Ele bem que gostaria de saciar-se com o que os porcos comiam, mas ninguém lhe dava nada. 17 Então, caindo em si, disse a si mesmo: 'Quantos empregados de meu pai têm pão de sobra, enquanto eu, aqui, morro de fome! 18 Vou voltar ao meu pai e lhe direi: 'Pai, pequei contra o céu e contra ti. 19 Já não mereço ser chamado teu filho. Trata-me como a um dos teus empregados'. (Lucas 15, 11-19)

O Pai deve ocupar o centro de nossas vidas!

Note que a narração começa dizendo que "um homem tinha dois filhos". Como dissemos, o personagem central da parábola é a figura do pai. Comumente, a figura do filho mais jovem é sempre colocada em destaque até porque a mensagem desse texto é tão forte e marcante que rapidamente nos identificamos com esse jovem. Porém, parece que Jesus quis que a atenção de seu público ouvinte estivesse fixada na figura do pai, dadas aquelas circunstâncias do ambiente e das pessoas para quem ele falava, que tratamos na parte 5 dessas postagens.

Quem é o filho mais jovem?

Quem pede ao pai a parte dos bens que lhe cabe é o filho mais jovem. A idade do filho, nesse caso, não possui nenhuma dimensão cronológica, ao contrário, quer relatar muito mais um modo de comportar-se diante da vida. O jovem da parábola demonstra que possui predisposição de viver a vida (e isso não é mal!), porém pensa haver sabedoria suficiente para enfrentar sozinho tudo o que ela lhe reserva. Qunatas vezes nós não achamos que podemos tomar nossas decisões sozinhos e de que não precisamos do Pai (de Deus) para nos dizer o que é certo ou errado fazer. E esse tipo de comportamento independe da idade que temos; a independência, confundida com soberba e auto-suficiência pode se manifestar, infelizmente, mesmo nas pessoas já bem adultas...

O que é que o filho pede? O que é que a vida lhe retira?

Veja que o filho também não pede nada de absurdo ao pai. Ele pede simplesmente a parte que lhe cabe da herança. Pede, portanto, aquilo que é, por direito, seu! No entanto, o gesto de pedir a parte da herança significa o ato de retirar das mãos do pai o controle sobre sua vida. É aquele ato de um sentido de independência irresponsável que nos leva a nos afastarmos de Deus. Entenda, meu irmão e minha irmã, que em momento algum Jesus nos diz que o pai se afastou do filho. O ato de se afastar e de ir para uma "região longínqua" é sempre do filho. Em outras palavras, significa dizer que nós é quem, por nossas atitudes, escolhemos nos afastar de Deus. Deus, por sua vez, respeita sempre nossa decisão ("e o pai fez para eles a partilha dos seus bens"), mas jamais se afasta de nós um momento sequer!

A narração continua e lemos que nessa "região longínqua", o filho "gastou todos os seus pertences numa vida desregrada". Muito interessante essa descrição. Veja que é o tipo de vida que ele levava que lhe retirou toda a herança que trazia consigo. E que herança é essa? Bem, é a parte dos bens do Pai que lhe cabia. É a Graça, meus irmãos! Trata-se da graça de Deus derramada em nossos corações. Infelizmente, muitas vezes é o estilo de vida que escolhemos viver que nos impede viver em estado de graça. As escolhas que fazemos ao longo da vida, se feitas numa atitude absolutamente independente de Deus, retiram-nos a Graça que conosco carregamos. Somos filhos de Deus, porém muitas vezes, vivemos como se não o fôssemos... E é assim que o jovem da parábola se percebe: "quantos empregados de meu pai têm pão de sobra, enquanto eu, aqui, morro de fome".

Até onde o filho realmente chegou?

A figura que Jesus utiliza para descrever o estado em que se encontrava o filho depois de ter perdido a graça de Deus é, para os judeus que o escutavam, a mais forte que ele poderia escolher. Jesus fala que o filho foi trabalhar com os porcos. Para os judeus, isso significa o cúmulo da degradação de uma pessoa, pois o porco era considerado um animal impuro (cf. Dt 14,8) e, totalmente impuro era aquele que mantinha algum contato com eles. Porém, Jesus vai mais longe na descrição, pois diz que não somente trabalhava com os porcos, mas procurava comer o que lhes era dado como alimento! E, por fim, o máximo grau de degradação que uma pessoa poderia atingir. Há, ainda, mais um detalhe que não podemos deixar despercebido. Nós traduzimos a passagem por "Ele bem que gostaria de saciar-se com o que os porcos comiam". Na verdade, a palavra dos textos originais sugere que devamos traduzi-la não por "saciar-se", mas algo próximo a "encher a barriga". De qualque forma, o modo como o filho deseja comer não era humano, era tão "animal" quando a situação que ele vivia...

Só nessa imagem já encontramos uma bela razão para aqueles que se consideram indignos do amor de Deus, de reaverem no coração a certeza de que o Pai os ama profundamente. Ninguém de nós, por pior que seja, poderia chegar à semelhante situação descrita nessa parábola. Pessoa alguma chegou onde o jovem da parábola chegou, por mais "longe" que tenha ido...

Porém, o acento que Jesus quer dar, como veremos, não é na situação em que o jovem se encontra. Com muito maior riqueza de detalhes, ele descreverá a maneira como o Pai acolherá esse filho... Para nós, hoje, no entanto, basta saber que esse filho toma a decisão mais sensata que poderia tomar: retornar á casa do Pai. É bom compreender que a decisão de retornar é tão livre quanto a de ter saído de casa... Por isso temos insistido que a verdadeira mudança de vida parte de uma decisão do coração. Ninguém poderá fazer isso por nós! Nós temos que nos decidir a voltar para o Pai, todos os dias de nossa vida!

A decisão que o filho mais jovem toma é tão madura, tão concreta que ele mesmo admite não merecer mais ser chamado de "filho", ou seja, ele havia perdido essa dignidade, não se sentia mais filho. Era assim que ele pretendia se apresentar ao Pai! Pretendia, com toda a razão do mundo, pedir para ser tratado como um dos empregados da casa.

Hoje, paramos por aqui... Mas lhes convido a retomarem o texto mais uma vez e rezarem a partir dele. Não tenho dúvidas de que Deus deseja lhes falar, ao coração, aquilo que minha incapacidade não me permitiu dizer aqui.

Com afeto salesiano
P. Mauricio Miranda.

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